Nascemos e saltamos, um após o outro, os degraus da
existência. Aprendemos a admirar estes espaços intercalados por sonhos e
pesadelos, e admiramos a maravilhosa batalha dos seus silêncios. Vivemos numa
constante dificuldade em conseguir encontrar os nossos caminhos.
Zé Paulo aprendeu a escutar o ruído dos sonhos, dos pesadelos
e de muitos dos seus desassossegos. O silêncio de hoje foi mais estridente que
o habitual. O dia acordou assim alvoroçado. É usual ele estar atento a estas
particularidades invisíveis das substâncias, e deu conta do distúrbio muito
antes do sol acordar. Havia qualquer coisa de diferente a pairar no ar esta
madrugada. Zé Paulo conseguiu discerni-lo no bailado impercetível das
moléculas.
O movimento dessas partículas torna-se audível, se soubermos
como escutar, e são essas ínfimas alterações que podem influenciar, de maneira
devastadora, tudo o que ainda está para acontecer.
- Este nosso universo é cruel e violento! Foi abandonado à
nascença, e vive em constante sobressalto.
Zé Paulo medita enquanto regressa a casa depois da visita ao
local do acidente. Muitas são as coisas que deixaram de fazer sentido. Será que
alguma vez na vida as coisas conseguirão voltar a fazer algum sentido? Sofia
passou a fazer parte dos seus pensamentos como nenhuma outra mulher. Ele ainda
não sabe como isso foi possível, é um mistério que não vem explicado em nenhum
manual e não se conseguirá resolver com a aplicação de um qualquer teorema ou
equação. Hoje de manhã quase lhe disse para ter muito cuidado com a condução
mas, como é seu hábito, calou essas palavras com receio da desordem que elas
pudessem causar.
- Cansei-me de estar permanentemente a olhar para um céu
mentiroso, cansei-me de ler livros carregados de teorias rebuscadas que tentam
elucidar o inexplicável. Estou farto de fugir, de me esconder deste passado que
não escolhi. Estou até cansado do próprio cansaço acumulado.
Zé Paulo decidiu não deixar passar em silêncio mais este dia.
As regras que se estendem ao macrocosmos também são válidas
no microcosmos, e é por isso que tudo neles é tão previsível e se relaciona da
mesma maneira há quase catorze mil milhões de anos.
- Talvez o universo seja bem mais antigo do que aquilo que
todos imaginamos. Talvez!
Sem comentários:
Enviar um comentário